Conviver Com as Suas Muda Tudo
Há 9 meses me propus parar de perder tempo com mulheres heterocentradas, principalmente as que exigem que lésbicas sejam seu suporte emocional, reproduzam o papel masculino na relação e são pintadas tão agressivas quanto eles a fim de que a punição social do escracho se encarregue de compensar quando uma dessas que só faltam elaborar o manifesto da exigência de aprovação e súplica de desejo é rejeitada.
Estar entre as minhas corroborou muito minha perspectiva enquanto lésbica radical: o feminismo não deve ser o clube de suporte emocional, não deve haver culpa ou vergonha em priorizar nossas problemáticas, certamente exigirão que você abaixe as costas a fim de carregar os problemas de todos nela, misticismo só atrapalha qualquer movimento, o antirrealismo floresce do subjetivismo, toda heterocentrada certamente tem na manga um relato onde uma lésbica é comparada a um homem, vão relativizar toda a sua oposição a escolha ou falta dela a fim de justificar a conciliação e minimizar seus atos, mulheres continuam não precisando ser amigas para lutar na mesma causa (mas é necessária cautela com as sentimentalóides vingativas que corroboram a visão da mulher insana, dependente e fraca), ninguém tem dever de maternar quem quer que seja, quem acredita piamente que homens são indispensáveis que se sujeite a eles, não tem negociação com dominador.
O cenário prossegue bem desagradável para as radicais de fato: existe desconhecimento e deturpação generalizada proposital das justificativas de nossas propostas, comparação desonesta com o conservadorismo, apelo emocional a fim de conquistar nossa servidão no choro, muito textão na internet e pouca articulação no mundo real.
Pequenos núcleos onde a política possa ser colocada na mesa sem os gritos de censura tão comuns agora para deslegitimar ou minimizar questões alheias são revigorantes de fato. Nesses espaços a auto-crítica séria e uma análise de estratégia podem ser realizadas de forma plena, sem a covardia das redes sociais, sem o reforço de um cérebro onde o racional não supere o emocional, sem a patrulha da condenação moralista e exposição, com petiscos, encaminhamentos, fala cronometrada ou em modelo mais informal, mas que não descambe para a terapia em grupo, desde que realizada por quem saiu do papel de fêmea frágil e quer reação, por quem não se sujeita a quem quer que seja.
Poucas companheiras dão esperança real de virar o jogo, a maior parte continua medrosa por saber que a defesa é menor que a porrada ou por superestimar a porrada, mas quando uma de nós perde o medo, aprende a levantar a cabeça e falar alto, há um movimento de correção em seguida para deslegitimar essa mulher como privilegiada de alguma forma, se ela não sucumbir retornando ao “sono dogmático” criado pelo patriarcado e reproduzido pelas oprimidas, será a maior ameaça à cadeia invisível em que nos prenderam.
No mais, não precisamos ser amigas, mas boa parte se admira, volta a noção que o mundo real é bem outro, articulações surgem, começa a fazer sentido. Reunam e organizem as suas.
Lésbicas não devem nada a grupo nenhum, lésbicas têm o direito de se priorizar.